sábado, 31 de julho de 2010

Oráculos do Cotidiano

Já faz algum tempo que eu venho observando um comportamento peculiar de quase todas as pessoas para com os estudantes de psicologia; um comportamento que se revela, a um só tempo, (tragi)cômico e intrigante. Falo do tom de confissão com que os amigos fazem toda sorte de perguntas a respeito de uma serie de comportamentos que eles observam, a principio, nos amigos, parentes, vizinhos, estranhos, etc., mas para as quais não encontram respostas racionais.

O que é (tragi)cômico, nesse tipo de postura, é a necessidade explicita da pessoa de uma resposta imediata para um problema ou situação que necessitaria de uma serie de analises e diferentes abordagens para ser solucionada e/ou esclarecida. Por exemplo, quando estou com um amigo[a] e encontramos um amigo dele[a] que eu desconheço e, por vias do acaso, ele[a] acaba mencionando que sou estudante de psicologia, o sujeito, que até então era um estranho, começa, gradualmente, a fazer uma serie de questionamentos sobre determinados comportamentos ou conceitos específicos da psicologia para as quais busca uma resposta mágica,pragmática.

Conceitualmente, eu não vejo ai nenhum problema, pois os conceitos fundamentais da ciência psicológica apresentam certa unidade, de modo que as diferenças pontuais entre alguns autores não modificam a raiz do conceito, como se percebe,por exemplo, em Winnicott, Melanie Klein ou Freud com relação à importância da mãe para o desenvolvimento sadio (em sentido amplo) da criança. Entretanto, quando o individuo exige (de modo tácito, obviamente), uma explicação para o homossexualismo do vizinho, para a esquizofrenia do tio, para a impotência do irmão, para o consumismo da irmã, para a agressividade do chefe, para a melancolia do amigo, eu fico perplexo.
Ressalto que não vejo tais perguntas como inoportunas, ou chatas, ou inconvenientes, tampouco quem as profere. O que me deixa perplexo é a latência do racionalismo e pragmatismo na nossa cultura. É nesse momento que fica evidente a necessidade da sociedade moderna (ou pós-moderna, como muitos adoram dizer, e que de certo modo acabou virando clichê, mas que eu desacredito, e para isso faço minhas as palavras de A.Cícero em seu livro O mundo desde o Fim) de obter respostas imediatas, de desarticulação do subjetivismo, de “ir direto ao ponto”.

Certa vez, em um seminário na universidade, ouvi dizerem que a nossa educação não foi desenvolvida para “produzir (ironia) pensadores” e que a raiz desta orientação cartesiana estaria voltada para o tecnicismo e, posteriormente, para a produção (aqui em sentido estrito).Como os meios de produção nunca exigem mais do que uma vista curta, esse hábito acabou por encurtar também a capacidade da grande maioria dos indivíduos de pensar com lucidez que lhe garanta algum discernimento,de modo que suas conjecturas são superficiais.) Lembro de ter comentado com um colega que aquilo era a explicação mais acertada para a ojeriza que a juventude (de modo geral) tem para com a filosofia, poesia, literatura, etc. e, em contraponto, por todo “amor” que devotam a tudo que é técnico, aparentemente científico, comprovado por uma percepção epistemológica inabalável, ou, trocando por miúdos, que seja Útil.Entretanto, esses inquisidores de toda a arte e filosofia nunca pararam pensar que elas são, na verdade, potencializadoras da capacidade analítica e de tudo que há de mais louvável na essência humana.

Estas perguntas, tão despretensiosamente pronunciadas, acabam fazendo com que eu me revire com tantas outras questões essenciais. Fico pensando, por exemplo, que este paradigma medicamentoso é só uma espécie de placebo para uma realidade que exige velocidade e não compreensão; e que, novamente, tenho que encarar a dialética do desejo, ou seja, é assim porque foi imputado no paciente, ou é porque é uma exigência do desejante, que nesse caso, deixaria de ser paciente para se tornar exigente?

Confesso que sempre fico impressionado com a negação da importância do simbólico na nossa cultura. Esta vontade de equacionar os dilemas humanos (demasiado humanos), para que, a posteriori, obtenham-se respostas imediatas a cerca de seus problemas com cálculos simplórios é, em si, a concretização de uma patologia.

Este objetivismo já impossibilitou a prática psicanalítica na rede pública de saúde, com a alegação de que seriam necessárias muitas (ou infinitas) consultas para se atingir um resultado satisfatório. Então, partiu-se para a frieza da prancheta e das cartilhas de medicamentos, enfim, para os médicos-piloto (analogia com os professores-piloto, ou seja, professores que não possuem plano de aula e que utilizam somente o livro didático.)

São constatações intrigantes, tema para um livro.

Todavia, para todos aqueles que pensam que todo esse discurso é uma bobagem, resta crer que há, nos estudantes de psicologia (que flertam com a mitologia), uma grande herança “genética” dos oráculos.

5 comentários:

Anônimo disse...

Mr Leal, é em tom de grande cordialidade e respeito por vossa senhoria que trago para discussão algumas reflexões que tenho tido ao ler algumas ideias que traz ao público em vossos textos. (COOPER, 2010)
No texto Um Quase Analfabeto Político (Mr. LEAL, 2010), vossa senhoria traz uma discussão a respeito da posição de uma esquerda meio Teletubbies .
Tenho pensado a partir de autores como “BRASIL, o meu cachorro de estimação”, ( Brasil porque é um vira lata inteligente e de raça, que inclusive o senhor teve a oportunidade de conhecê-lo), que o mundo tem sofrido algumas modificações. (BRASIL, 2009)
A coca cola já tomou conta da china (GESSINGER, 1987), essa frase não se trata de um usucapião do sócius por essa grande instituição, bicho papão ou mula sem cabeça para alguns, que atualmente chamamos de capitalismo.
Aqui trato a discussão entre esquerda-direita, (com todo respeito que vossa senhoria merece e o seu interlocutor o “anônimo”), como uma mera discussão estética a respeito de uma problemática infinitamente maior, ou seja, Arroz e feijão ou feijão e arroz, como os senhores preferirem.(BRASIL, 2010)

Não podemos mais dividir o mundo entre esquerda e direita, Maragato ou Chimango, Xuxa ou Angélica. É fundamental nesse momento pensar as coisas como integradas, interligadas, sem fronteiras. O que seria da pobreza sem a riqueza ou vice-versa, da beleza sem a feiúra, há aldeia no global e o global na aldeia. E por favor, não encarem isso como uma visão anarquista ou socialista ou comunista de um sócius pós-moderno, ou moderno como alguns preferem chamar a contemporaneidade. Falo de uma sociedade que passou por guerras e muitas injustiças, que ainda são fomentadas, por separar e dividir tanto as coisas e as pessoas, negar acesso.(COOPER, 2010)

Sobre o governo do senhor Lula, penso que é uma grande injustiça chamá-lo de populista. Esse adjetivo talvez deva-se a sua personalidade mais para fora do que para dentro, mais prática do que intelectualóide, distante da Academia, único local de produção de conhecimento para alguns.
Um governo que proporcionou acesso, merece no mínimo
uma comparação com governos anteriores para mensurá-lo de uma forma coerente.
Vossa senhoria é prova disso, menino pobre, vindo da Bahia, cortador de cana, contador de estórias, ainda arredio a intelectualidade, chega na cidade grande e depois de instruído e catequizado, consegue acesso ao berço do conhecimento do homem branco, chega aos bancos da universidade.
Talvez alguns achem pouco o que mudou, eu prefiro pensar que é um começo.

Cordialmente,

Corpo Estranho e Brasil (meu oráculo do cotidiano).

Bruna disse...

O meu colega Oráculo preferido!! Como assim tu não tem uma teoria Psi pra determinar o motivo do homossexualismo do meu vizinho?? Como assim? Como ASSIM (Berros alucinantes de desespero).

Voltei do Uruguay e já estou farta dessa coisa toda de gente sem sangue nas veias!!

SOCORRO amigo Edson, acho que estou prestes a surtar e o meu plano de saúde não abrange Psicanálise!!

Bjo

Edson Leal disse...

Mr. Cooper,
1- A discussão não era sobre uma esquerda "Teletubbies", mas sobre uma esquerda que, de tão forte, pode vir a derrubar a democacria e instituir uma ditadura. Ou seja, que pode transformar o dócil Brasil em um Pitt Bull venezuelano.
2- “Crônica”, sim, pode gerar uma discussão estética. Quanto à aproximação entre China e Capitalismo, é só uma tentativa equivocada de destruir as fronteiras com base no argumento de que o capitalismo invadiu o comunismo chinês e tudo virou um grande circo com mulas sem cabeça,Xuxas, fantasmas, sacis e cães sem dono.
3- Nunca encarei o adjetivo populista como pejorativo (e aposto que o Serra, a Dilma e a Marina também não).
4- Eu sou o principal critico dos “acadêmicos” dados a falácia e a inércia, principalmente os de esquerda, que são encontrados em maior quantidade atualmente, porque é moda.
5- Em que momento eu critico o governo Lula? Então por que preciso compará-lo com outros presidentes?
6- A minha condição não pode servir como base, pois, se assim fosse, caso ganhasse na megasena, eu deveria sair gritando, aos quatro cantos do mundo, que O Brasil é o país das maravilhas... Ou, ainda, se o Brasil não me mordesse, mas devorasse uma centena de crianças, eu insistisse que se trata de um cão dócil... Isto não seria coerente, nem humano, nem “SER VIVO”. Isto seria a ditadura do meu modo de ser...
7- Ainda vamos discutir isto pessoalmente, amigo.
abraço

Edson Leal disse...

Bruna,
Acalme-se...rsrsrs
Ter eu ainda não tenho, mas estou estudando...aliás, estamos... chegaremos lá.
Quanto ao plano,esqueça,afinal, receio que um amigo possa ser um "psicanalista engarrafado"; e com várias garrafas...

Elídia :) disse...

PENSSR É TÃO PERIGOSO E TRANSGRESSOR Q DEVERIAM ALGEMAR E ENCARCERAR (E AMORDAÇAR É CLARO) AS PESSOAS OUSADAS E SEM ESCRÚPULOS Q FAZEM ISSO...É O Q ACHO